quarta-feira, 29 de abril de 2009

poema bonitinho

SERENANDO...




A chuva beija a terra
Com hálito de menta...

O desejo do dia
Possuindo a noite
Me dita esperanças...

Ainda que haja um abraço
Não sei se passo
Não sei se faço
Com que volte a chover...

A terra, fecundada, engravida
De ilusão e choros vãos...

Do alto do céu _ breu...
Do cio da terra _ gravidez...
Da esperança _ o nada...

Na esperança de frutificar e,
Com esperança, de viver...
A chuva beija a terra
Para engravidá-la de novo!

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

POEMA

TIRÁ DA CARCUNDA
Autor: Ulysses Rocha Filho(14/07/2008)


Largou o serviço
Garrou de ficar discaçoado
Deixano tudo que taí!


Pois é, num passa de hoje
Em des que nasci sofro
Mas tá bão...
Num passa de hoje, não.



Em vez de ficar sofreno
_ que tá ruim mas tá bão! _
Vô mudá de vida...


Tava uma sarna pra viajar
Tava uma sarna pra voltar
Tava uma sarna pra num ir
Tava uma sarna pra num existir


Mas aí falei assim:
êta mundim apertadim
Passado de bão,
Melhor durmir que morrer...

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

CONTO

E POR FALAR EM ROMEU & JULIETA...

Chegou às dez com a intenção de sair às duas da tarde. Era a primeira vez que visitava a mocinha para fazer a corte. Seu pai avisara não se demore com falatórios com o sogro, cumprimente a todos e elogie a comida. Mas nada disso seria feito: ao contrário, chegou, buzinou e apertou a campainha, de modo irritante, por seis vezes seguidas.

Impossível ser romântico no século XXI. Mas tentava: este presente é seu, meu docinho! Minha mãe é que sugeriu!, disse _ de forma canhestra _ e, fogo, foi recompensado com um muxoxo: tem certeza de que este anel não é bijuteria?

Foram ao motel e ao parque, comeram pipoca no cinema e voltaram para o aconchego de suas famílias por volta das duas horas da tarde _ como prometido mas não necessariamente naquela ordem descrita...

As mães elogiaram e os pais viram que a ameaça era mais perigosa: poderia correr tudo nos conformes e redundar em casamento! Não ia dar certo se levar em consideração que eram adolescentes (ele de 18 e ela de 16 incompletos). Não ia dar certo! A política de não proibir era a melhor saída tendo em vista que os pais eram amigos de longa data e receavam que a síndrome de Romeu e Julieta poderia repetir a qualquer instante. Ainda mais naquela idade...

O sogro paterno e o sogro materno combinaram uma conversa reservada. Ficou acertado que o rapaz deveria viajar para a capital, fazer um cursinho para o vestibular e fixar residência longe da julietazinha. As sogras acharam imprudente mas concordaram. Os filhos foram avisados e, desidratados de tanto chorar juras de amor, perceberam a armação dos pais. Resignaram-se. As contas dos celulares e dos e-mails seriam estrondosas mas tudo seria contornado em nome do amor:

_ Não vou te esquecer se receber um e-mail por dia... Tente se lembrar de mim!

_ Nem eu, minha vida... Vou namorar o anel que você me deu o dia todo...

Como lembrança daquele amor juvenil, ele guarda o piercing da sobrancelha dela e ela, o filho que a família dele não quis assumir...



Publicado no livro: E POR FALAR EM AMOR, vol.2 _ LITTERIS EDITORA - p. 391/392 (2004)

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

EU DETESTEI 'CAPITU'

A Rede Globo matou Machado de Assis (MA). Foram quatro ou cinco capítulos super-escuros, complicados para a platéia do sofá e com um estilo quase barroco. Muito farsesco e distante do que imagina-se ser o romance secular DOM CASMURRO _ um ícone literário que, entre outros méritos, traz uma caso de amorentre dois homens: Escobar e Bentinho. A partir daí, nos 50 capítulos finais da obra, tudo se desenrola. De forma avassaladora, as mortes acontecem, o bruxo do Bentão velho tece suas maldades, escamoteando o seu amor de seminário porque vê, aténo filho, as feições do amigo Escobar. Ciúmes? Que seja do amigo e, não, da esposa. Ou melhor: pode ser da esposa que andava saindo com o marido da Sancha.
Com um enredo desses a minissérie apresentou uma costura dos melhores momentos (fielmente à obra, diga-se de passagem!) mas com a tal estética do diretor. Muito rebuscado para os meus olhos casmurros. Muito over para a realidade da Globo.
De qualque forma, uma estética que ligava raps, Beirute Band, alta costura, uma pitada de Felline e Bergman e, muito, mas muito mesmo de escuridão... Haja controle remoto para dar brilho e contraste às imagens... O mistério, senso comum, da tal traição (ou não) de D. Capitu perdurou _ como não poderia ser diferente. Se nem Bosi deu conta de solucionar o caso, para que o fazê-lo? Melhor a lenda ou o mito do que a verdade ou a novidade!
De qualquer forma, parte dois, todos sabíamos que, em se tratando da rubrica MA, era um vespeiro aldulterar a dúvida do ensaio sobre o ciúme (que é a obra,em resumo). Por isso, deu no que deu: MA fica cada vez mais idolatrado por uma minoria e "nem dou conta de ler" por uma maioria. E o país continua a crescer sem os devidos incentivos à leitura... Sorry!

E SE OBAMA FOSSE AFRICANO?? GANHARIA SAPATADAS DE JORNALISMO IRAQUIANO???

E se Obama fosse africano?


Por Mia Couto (escritor moçambicano)

Os africanos rejubilaram com a vitória de Obama. Eu fui um deles. Depois de uma noite em claro, na irrealidade da penumbra da madrugada, as lágrimas corriam-me quando ele pronunciou o discurso de vencedor. Nesse momento, eu era também um vencedor. A mesma felicidade me atravessara quando Nelson Mandela foi libertado e o novo estadista sul-africano consolidava um caminho de dignificação de África.

Na noite de 5 de Novembro, o novo presidente norte-americano não era apenas um homem que falava. Era a sufocada voz da esperança que se reerguia, liberta, dentro de nós. Meu coração tinha votado, mesmo sem permissão: habituado a pedir pouco, eu festejava uma vitória sem dimensões. Ao sair à rua, a minha cidade se havia deslocado para Chicago, negros e brancos respirando comungando de uma mesma surpresa feliz. Porque a vitória de Obama não foi a de uma raça sobre outra: sem a participação massiva dos americanos de todas as raças (incluindo a da maioria branca) os Estados Unidos da América não nos entregariam motivo para festejarmos.

Nos dias seguintes, fui colhendo as reacções eufóricas dos mais diversos recantos do nosso continente. Pessoas anónimas, cidadãos comuns querem testemunhar a sua felicidade. Ao mesmo tempo fui tomando nota, com algumas reservas, das mensagens solidárias de dirigentes africanos. Quase todos chamavam Obama de "nosso irmão". E pensei: estarão todos esses dirigentes sendo sinceros? Será Barack Obama familiar de tanta gente politicamente tão diversa? Tenho dúvidas. Na pressa de ver preconceitos somente nos outros, não somos capazes de ver os nossos próprios racismos e xenofobias. Na pressa de condenar o Ocidente, esquecemo-nos de aceitar as lições que nos chegam desse outro lado do mundo.

Foi então que me chegou às mãos um texto de um escritor camaronês, Patrice Nganang, intitulado: "E se Obama fosse camaronês?". As questões que o meu colega dos Camarões levantava sugeriram-me perguntas diversas, formuladas agora em redor da seguinte hipótese: e se Obama fosse africano e concorresse à presidência num país africano? São estas perguntas que gostaria de explorar neste texto.

E se Obama fosse africano e candidato a uma presidência africana?

1. Se Obama fosse africano, um seu concorrente (um qualquer George Bush das Áfricas) inventaria mudanças na Constituição para prolongar o seu mandato para além do previsto. E o nosso Obama teria que esperar mais uns anos para voltar a candidatar-se. A espera poderia ser longa, se tomarmos em conta a permanência de um mesmo presidente no poder em África. Uns 41 anos no Gabão, 39 na Líbia, 28 no Zimbabwe, 28 na Guiné Equatorial, 28 em Angola, 27 no Egipto, 26 nos Camarões. E por aí fora, perfazendo uma quinzena de presidentes que governam há mais de 20 anos consecutivos no continente. Mugabe terá 90 anos quando terminar o mandato para o qual se impôs acima do veredicto popular.

2. Se Obama fosse africano, o mais provável era que, sendo um candidato do partido da oposição, não teria espaço para fazer campanha. Far-Ihe-iam como, por exemplo, no Zimbabwe ou nos Camarões: seria agredido fisicamente, seria preso consecutivamente, ser-Ihe-ia retirado o passaporte. Os Bushs de África não toleram opositores, não toleram a democracia.

3. Se Obama fosse africano, não seria sequer elegível em grande parte dos países porque as elites no poder inventaram leis restritivas que fecham as portas da presidência a filhos de estrangeiros e a descendentes de imigrantes. O nacionalista zambiano Kenneth Kaunda está sendo questionado, no seu próprio país, como filho de malawianos. Convenientemente "descobriram" que o homem que conduziu a Zâmbia à independência e governou por mais de 25 anos era, afinal, filho de malawianos e durante todo esse tempo tinha governado 'ilegalmente" . Preso por alegadas intenções golpistas, o nosso Kenneth Kaunda (que dá nome a uma das mais nobres avenidas de Maputo) será interdito de fazer política e assim, o regime vigente, se verá livre de um opositor.

4. Sejamos claros: Obama é negro nos Estados Unidos. Em África ele é mulato. Se Obama fosse africano, veria a sua raça atirada contra o seu próprio rosto. Não que a cor da pele fosse importante para os povos que esperam ver nos seus líderes competência e trabalho sério. Mas as elites predadoras fariam campanha contra alguém que designariam por um "não autêntico africano". O mesmo irmão negro que hoje é saudado como novo Presidente americano seria vilipendiado em casa como sendo representante dos "outros", dos de outra raça, de outra bandeira (ou de nenhuma bandeira?).

5. Se fosse africano, o nosso "irmão" teria que dar muita explicação aos moralistas de serviço quando pensasse em incluir no discurso de agradecimento o apoio que recebeu dos homossexuais. Pecado mortal para os advogados da chamada "pureza africana". Para estes moralistas - tantas vezes no poder, tantas vezes com poder - a homossexualidade é um inaceitável vício mortal que é exterior a África e aos africanos.

6. Se ganhasse as eleições, Obama teria provavelmente que sentar-se à mesa de negociações e partilhar o poder com o derrotado, num processo negocial degradante que mostra que, em certos países africanos, o perdedor pode negociar aquilo que parece sagrado - a vontade do povo expressa nos votos. Nesta altura, estaria Barack Obama sentado numa mesa com um qualquer Bush em infinitas rondas negociais com mediadores africanos que nos ensinam que nos devemos contentar com as migalhas dos processos eleitorais que não correm a favor dos ditadores.

Inconclusivas conclusões:

Fique claro: existem excepções neste quadro generalista. Sabemos todos de que excepções estamos falando e nós mesmos moçambicanos, fomos capazes de construir uma dessas condições à parte.

Fique igualmente claro: todos estes entraves a um Obama africano não seriam impostos pelo povo, mas pelos donos do poder, por elites que fazem da governação fonte de enriquecimento sem escrúpulos.

A verdade é que Obama não é africano. A verdade é que os africanos - as pessoas simples e os trabalhadores anónimos - festejaram com toda a alma a vitória americana de Obama. Mas não creio que os ditadores e corruptos de África tenham o direito de se fazerem convidados para esta festa.

Porque a alegria que milhões de africanos experimentaram no dia 5 de Novembro nascia de eles investirem em Obama exactamente o oposto daquilo que conheciam da sua experiência com os seus próprios dirigentes. Por muito que nos custe admitir, apenas uma minoria de estados africanos conhecem ou conheceram dirigentes preocupados com o bem público.

No mesmo dia em que Obama confirmava a condição de vencedor, os noticiários internacionais abarrotavam de notícias terríveis sobre África. No mesmo dia da vitória da maioria norte-americana, África continuava sendo derrotada por guerras, má gestão, ambição desmesurada de políticos gananciosos. Depois de terem morto a democracia, esses políticos estão matando a própria política. Resta a guerra, em alguns casos. Outros, a desistência e o cinismo.

Só há um modo verdadeiro de celebrar Obama nos países africanos: é lutar para que mais bandeiras de esperança possam nascer aqui, no nosso continente. É lutar para que Obamas africanos possam também vencer. E nós, africanos de todas as etnias e raças, vencermos com esses Obamas e celebrarmos em nossa casa aquilo que agora festejamos em casa alheia.


Jornal "SAVANA" - 14 de Novembro de 2008

domingo, 14 de dezembro de 2008

SEM SUAR

SEM SUAR
Autor: ULYSSES ROCHA FILHO(08/12/2008)


Nem vai doer
Se não gritar
se não dizer não
se aguentar tudo
e pedir bis!

Não vai ser fim
Nem começo:
será durante!

Sem sal
Com sal
Insosso
Mas real:
com amor
(e tesão, por que não?).

Não vai ser fim
Nem começo:
será durante!

Nem vai doer
Se não gritar
se não dizer não
se aguentar tudo
e pedir bis!

Prazer em ser
Ter prazer sendo
O que ausente
não foi ou era!
Nem veio pra ficar
Sem ou com sal
Mas para suar:
num sensual suor!